Tenho recomendado aos meus amigos do on-line o livro "Como me tornei um estúpido", de Martin Page. Conhece? Várias de suas passagens repercutiram vivamente em minha alma, dentre as quais destaco uma que vem a propósito para este poema:
"Não é possível viver demasiadamente consciente, demasiadamente pensante. Aliás, observemos a natureza: tudo o que vive muito e contente não é inteligente. As tartarugas vivem séculos, a água é imortal (...). Na natureza, a consciência é a exceção; pode-se até postular que ela é um acidente, uma vez que ela não assegura nenhuma superioridade, nenhuma longevidade particular".
(p. 61)
Fiquei cogitando, depois que li este trecho, da angustiante condição humana: somos seres de consciência mais desenvolvida, de tal sorte que somos conscientes de nossa finitude. Ao contrário das tartarugas, a natureza de nossa consciência permite-nos refletir sobre nossa existência, que sabemos finita. O excesso de consciência é incompatível com a efemeridade de nossa existência. Temos pouco tempo para ousar apreender a complexidade desse existir cujo mistério nos abarca. O mais impressionante é que, até onde sabemos, somos os únicos seres capazes de reflexão, vale dizer, de pensar o já elaborado pelo pensamento. Daí, minha amiga, fui mais longe e pensei na aventura intelectual humana, pensei no legado de espíritos geniais que o gênero humano já produziu (o de Marx, Freud, Nietzsche, Einstein...); homens que viveram para as suas ideias, pelos seus pensamentos, que dedicaram toda uma vida a revolucionar cada qual em seu campo de interesse... todos passaram, apenas o seu legado permanece entre nós e, se preservado, acalentará os pensamentos de futuras gerações. Agora pense comigo: se não houver nada além da cessação da consciência com a morte, de que valeu o esforço intelectual empreendido por esses homens? Não digo para nós, seus beneficiários, para eles mesmos, que sucumbiram como deve sucumbir todo ser humano, quer intelectual, quer medíocre (ou estúpido). Estou sincera e verdadeiramente convencido de que não há um Deus como representado pela ideologia judaico-cristã. Sou ateu sereno e vivo satisfeito com o Mistério. E por vezes a sombra desse absurdo a que se refere avança contra os meus pensamentos e me ponho a especular sobre a possibilidade de essa existência ser cíclica (talvez, a morte seja um recomeço, talvez esse "eu", esse sentimento de "eu" único, singular, irrepitível seja eterno; talvez, cada novo reaparecimento desse eu que me diferencia do outro represente o apagamento da consciência de outros tantos reaparecimentos anteriores.)
O que aconteceria se nós soubêssemos de onde viemos (não a nossa origem na longa cadeia evolutiva; Darwin já nos ensinou...), refiro-me ao espantoso acontecimento da vida... o que aconteceria se nós soubéssemos qual é o propósito da vida e onde ela desembocará? Seríamos, por isso, mais felizes? Seríamos menos angustiados? Nossas inquietações cessariam? A vida é um grito no silêncio, nesse grandioso silêncio que se estende pela infinidade do universo. Estamos imersos nesse silêncio, nesse mistério silencioso, por isso a vida é mesmo absurda, porque excede nosso peculiar excesso de consciência. Viver transcende a consciência. Porque a vida se acha de permeio entre as duas pontas deste instigante Mistério. Nós estamos imersos nele, tentando respirar com nossos pensamentos.
Tua poesia já é um grito de vida! O que dói, no entanto, é como tantos têm perdido a capacidade de se surpreender, de se revoltar, de ser arrebatado. Tua poesia ainda é, (in) sisto, um grito tentando reavivar nossos ouvidos. "Eles estão surdos".
Will, A poesia - minha/tua/nossa - é uma grito de vida! e concordo e partilho dessa dor pela falta de poesia que ainda impera por aí. =/ obrigada pela voz aqui: é bom saber que o silêncio tb tem ecos...
9 comentários:
Com essa paisagem de palco, todo e qualquer grito fica poesia.
A vida tem sentido(s) que ignoramos.
Um beijo!
sentidos intransponíveis, caro...
beijos
Tenho recomendado aos meus amigos do on-line o livro "Como me tornei um estúpido", de Martin Page. Conhece? Várias de suas passagens repercutiram vivamente em minha alma, dentre as quais destaco uma que vem a propósito para este poema:
"Não é possível viver demasiadamente consciente, demasiadamente pensante. Aliás, observemos a natureza: tudo o que vive muito e contente não é inteligente. As tartarugas vivem séculos, a água é imortal (...). Na natureza, a consciência é a exceção; pode-se até postular que ela é um acidente, uma vez que ela não assegura nenhuma superioridade, nenhuma longevidade particular".
(p. 61)
Fiquei cogitando, depois que li este trecho, da angustiante condição humana: somos seres de consciência mais desenvolvida, de tal sorte que somos conscientes de nossa finitude. Ao contrário das tartarugas, a natureza de nossa consciência permite-nos refletir sobre nossa existência, que sabemos finita. O excesso de consciência é incompatível com a efemeridade de nossa existência. Temos pouco tempo para ousar apreender a complexidade desse existir cujo mistério nos abarca. O mais impressionante é que, até onde sabemos, somos os únicos seres capazes de reflexão, vale dizer, de pensar o já elaborado pelo pensamento. Daí, minha amiga, fui mais longe e pensei na aventura intelectual humana, pensei no legado de espíritos geniais que o gênero humano já produziu (o de Marx, Freud, Nietzsche, Einstein...); homens que viveram para as suas ideias, pelos seus pensamentos, que dedicaram toda uma vida a revolucionar cada qual em seu campo de interesse... todos passaram, apenas o seu legado permanece entre nós e, se preservado, acalentará os pensamentos de futuras gerações. Agora pense comigo: se não houver nada além da cessação da consciência com a morte, de que valeu o esforço intelectual empreendido por esses homens? Não digo para nós, seus beneficiários, para eles mesmos, que sucumbiram como deve sucumbir todo ser humano, quer intelectual, quer medíocre (ou estúpido). Estou sincera e verdadeiramente convencido de que não há um Deus como representado pela ideologia judaico-cristã. Sou ateu sereno e vivo satisfeito com o Mistério. E por vezes a sombra desse absurdo a que se refere avança contra os meus pensamentos e me ponho a especular sobre a possibilidade de essa existência ser cíclica (talvez, a morte seja um recomeço, talvez esse "eu", esse sentimento de "eu" único, singular, irrepitível seja eterno; talvez, cada novo reaparecimento desse eu que me diferencia do outro represente o apagamento da consciência de outros tantos reaparecimentos anteriores.)
O que aconteceria se nós soubêssemos de onde viemos (não a nossa origem na longa cadeia evolutiva; Darwin já nos ensinou...), refiro-me ao espantoso acontecimento da vida... o que aconteceria se nós soubéssemos qual é o propósito da vida e onde ela desembocará? Seríamos, por isso, mais felizes? Seríamos menos angustiados? Nossas inquietações cessariam?
A vida é um grito no silêncio, nesse grandioso silêncio que se estende pela infinidade do universo. Estamos imersos nesse silêncio, nesse mistério silencioso, por isso a vida é mesmo absurda, porque excede nosso peculiar excesso de consciência. Viver transcende a consciência. Porque a vida se acha de permeio entre as duas pontas deste instigante Mistério. Nós estamos imersos nele, tentando respirar com nossos pensamentos.
Beijos, querida!
Lindo poema!
Sucinto e vasto!
o silêncio é
(até que o matem)
armadilha fatal.
Postei um texto-diálogo agorinha! Depois dá uma passadinha por lá...
Beijos, querida!
amigo tão querido,
eu sempre receio a impossibilidade, a intangibilidade das palavras... principalmente na gratidão.
mas obrigada!
beijos
.
às vzs ele é mesmo, cara Jéssica!
às vzs, redentor.
beijo
Tua poesia já é um grito de vida!
O que dói, no entanto, é como tantos têm perdido a capacidade de se surpreender, de se revoltar, de ser arrebatado. Tua poesia ainda é, (in) sisto, um grito tentando reavivar nossos ouvidos. "Eles estão surdos".
Will, A poesia - minha/tua/nossa - é uma grito de vida!
e concordo e partilho dessa dor pela falta de poesia que ainda impera por aí. =/
obrigada pela voz aqui: é bom saber que o silêncio tb tem ecos...
beijo
Pra mim só faz sentido.
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