quarta-feira, 15 de abril de 2009

*Exílio


Como de costume, mais um causo ocorrido no ônibus, voltando da faculdade... Chuva; eu de havaianas; semi-ensopada... Confortabilíssima! E não mais variável: vinha mergulhada em minhas leituras, que não as obrigatórias (essas deixo para cima da hora), mas as prazerosas, que me não exigem tempo final de término ou muitas anotações reflexivas.

Não mais variável ainda, entra um sujeito a falar em “bom” tom, pedindo desculpas pela interrupção do silêncio da viagem (como se isso adiantasse algo, de fato!) e algum tipo de “esmola” a fim de pagar sua passagem. Em seguida, vem a história triste, sob o sotaque cantante, que logo reconheço...

“Meu nome é Luis, tenho 53 anos, vim de Passo Fundo/RS (!) e cheguei aqui no Rio, cidade grande, com muitas expectativas, mas logo fui recebido por uns assaltantes que levaram todo meu dinheiro, com o qual pretendia me manter por um bom período...” Etc, etc, etc. Pensei: Que r[d]ecepção, meu Rio! Cadê aquela hospitalidade de que tanto falam?

Logo que alguém se precipitou a pagar a passagem do sujeito, e que ele passou a roleta, mais um pouco de história sobre a fome e a dificuldade de emprego, etc, etc, etc. Eu, com o “Rio Card” da minha tia; umas pratinhas na carteira; nem me prontifiquei. Rosto de piedade e, no fundo, matutando: Daqui ele sai, desce no próximo ponto, entra em mais um ônibus, conta a mesma história, tem sua passagem paga, ganha mais uns pela referência à fome; reticências.

Então, um passageiro bonifica-o com uma nota de vinte reais (vinte!) e completa, quase que lulísticamente: “Aqui, companheiro. Também passei por isso e entendo tua situação...” O sujeito agradece e Deus abençoa o caridoso umas mil vezes e ele passa por mim com sua bolsa encharcada de chuva; bate com ela na minha cara e joga minha (falsa?) expressão piedosa no chão e se vai por aí a fora.

E eu penso: Que Exílio, meu deus...



*Leitura referida: LUFT, Lya. Exílio.

7 comentários:

Cris disse...

Adoro tuas "histórias cotidianas de rodovias"! rs
Bjs

Marcia disse...

Ai, Rafa...

Você não é minha filha mas me dá tanto orgulho...!!!!!!!!!!!!

Beijos, linda!

@_-¯Cristiano Quaresma¯-_@ disse...

Pois é... e mesmo que ele desça e pegue outro "busão", como se diz aqui pelas terras da garoa (SP), e conte a mesma história, e etc... mesmo assim, nessa hora valorizamos o nosso mínimo pão duro amanhecido de cada dia... e assim vamos!
NAMASTE!

Rafaela Gomes Figueiredo disse...

justo...
por isso, depois, a minha sensação de mal-estar.

abraços!
obrigada pela visita.

Fernanda Toledo disse...

Este exílio que "ele se colocou" pode ser reversível? Quantas hístórias, quantos ônibus ele vai ter que pegar até que as referências à fome sejam apenas referências?

Rafaela Gomes Figueiredo disse...

é, são questões a que me submeto tb.
mas será que só nós - meros cidadãos, sem poder político - é que vemos isso?

muriloha disse...

Belíssimo blog, belíssimos poemas.